Escolha uma Página

Hoje, 18 de abril, comemora-se o Dia Nacional do Livro Infantil, em homenagem ao nascimento de Monteiro Lobato, precursor da literatura infantil brasileira. Por isso, o blog Fio de Ariadne, em parceria com a editora Zahar, convocou uma blogagem coletiva com o tí­tulo deste post. A ideia é dizer que autor(es) nos influenciou(aram) a gostar de ler.

Apesar de minha mãe ter me dado de presente de um aninho a coleção completa de Monteiro Lobato (que ainda guardo com o maior carinho), quem mais influenciou minha paixão pela leitura foi Viní­cius de Moraes.

Essa paixão começou com as revistas em quadrinhos, como Tio Patinhas, Mickey etc. Só que, como eu ainda não sabia ler, dependia de outras pessoas lerem para mim. Até que, aos 4 anos, pedi ao meu pai que me ensinasse a ler e escrever. E aprendi.

Estávamos em 1969, época dos hippies e da Bossa Nova. Meus pais ouviam muita música e eu acompanhava o gosto musical deles, claro. Foi quando aprendi a amar Chico Buarque, Tom Jobim e Vinícius de Moraes, dentre outros compositores e intérpretes nacionais e estrangeiros.

Mais ou menos um ano depois, em 1970, eles compraram o livro “Antologia Poética de Vinícius de Moraes“. Quando vi que as letras das músicas dele estavam ali, simplesmente enlouqueci. Não desgrudei mais do livro. Com 5 anos de idade, andava com ele debaixo do braço para todos os cantos, inclusive para a escola. Li tudo! Amava cada página daquele livro!

Foi assim que aprendi a gostar de literatura. Um caminho maluco, já que a maioria das pessoas “normais” começa a gostar de livros infantis e depois, na adolescência, começa a ler e se apaixonar pela poesia.

Mas isso não quer dizer que deixei de ler livros infantis. Apenas fiz o caminho inverso ao “normal”: comecei pela poesia e depois fui para a literatura infantil. Naquela época, a Ediouro visitava regularmente as escolas com um catálogo de livros infantis. Era comum eu comprar uns 2 ou 3 a cada visita da editora. Foi assim que conheci Ganymédes José e Orígenes Lessa, por exemplo.

E a escola também tinha uma ampla biblioteca de livros infanto-juvenis. Toda semana tínhamos uma “aula de biblioteca”, na qual visitávamos o local, escolhíamos um livro e passávamos uma hora lendo em silêncio. Tudo isso ajudou a criar em mim o hábito de ler.

Essa mesma escola nos obrigava a ler um livro a cada bimestre e fazer uma prova de interpretação. Eu lia todos, enquanto meus amigos (já naquela época) liam resumos dos livros pouco antes de fazerem a prova. O único dos indicados que – confesso – não consegui ler foi “O Guarani“, de José de Alencar. Não passei das primeiras páginas. Pedi um resumo aos meus pais e fiz a prova. (Passei na prova, obrigada.)

Para a escola, li “A vaca voadora“, “Memórias de um sargento de milí­cias“, “Mar morto“, “O caso da borboleta Atí­ria“, “O menino do dedo verde“, “Dom Casmurro“, “A morte e a morte de Quincas Berro d’água” e vários outros livros dos quais não vou me lembrar agora, mas que foram igualmente importantes para minha formação de leitora.

Em casa, por conta própria, li “As aventuras de Tom Sawyer“, “Huckleberry Finn“, “O pequeno prí­ncipe[bb]“, “Moby Dick” e vários outros clássicos da literatura infanto-juvenil nacional e mundial, inclusive a coleção do Monteiro Lobato que citei no início do post.

Lembro bem da cara do meu professor de literatura no Marista de Brasí­lia, quando perguntou, na primeira aula: “Quantos livros vocês leram no ano passado?”. E eu respondi um número alto (que não me lembro, mas deem um desconto porque isso aconteceu em 1976 – hehehe). Era mais ou menos como se todos os alunos respondessem 1, 2 ou 3 e eu respondesse 15. O professor fez uma cara de descrente e repetiu a pergunta: “Não, Cláudia, quero saber quantos você leu no ano passado, não na sua vida toda.” Fiquei revoltada e repeti o número. O cara quase caiu da cadeira! Arregalou os olhos e disse que eu era uma aluna exemplar. (É, eu já era nerd quando criança.)

Mas nada me tira da cabeça que o que mais me encantou no Vinícius era que ele escrevia palavras “proibidas” (para mim, aos 5 aninhos) em suas poesias, como pipi e cocô. Naquela época, este era meu poeminha preferido (além do “Poema Enjoadinho”, um clássico):

A estrelinha polar

De repente o mar fosforeceu, o navio ficou silente

O firmamento lactesceu todo em poluções vibrantes de astros

E a Estrelinha Polar fez um pipi de prata no atlântico penico.

Vinícius de Moraes, Oceano Atlântico, a bordo do Highland Patriot, a caminho da Inglaterra, 09/1938

Como vocês podem ver, o motivo inicial pode não ter sido dos mais nobres, mas o resultado foi ótimo. Essa paixão pela leitura foi o que me levou à  profissão de tradutora e revisora de livros, como já contei aqui na minha biografia.

(P.S.: Escrevi este post ao som dos Beatles para ajudar a trazer à  tona as sensações e lembranças da minha infância feliz.)